Menina indígena é morta e aldeia queimada na Terra Indígena Yanomami, segundo denúncias
Garimpeiro conversa com indígenas para que desmintam denúncias de crimes Foto: Reprodução de vídeo / fonte: Extraclasse.org.br

Há mais de uma semana, uma grave denúncia feita por Júnior Hekurari Yanomami, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye'kwana (Condisi-YY), desencadeou uma série de questionamentos sobre o sequestro, estupro e a morte de uma menina Yanomami, de 12 anos. Ela teria sido vítima de garimpeiros que exploram ilegalmente a Terra Indígena (TI) Yanomami. Há relatos de que, após a menina, uma mulher e uma criança indígenas terem sido levadas por garimpeiros, a aldeia teria sido incendiada e mais de 20 indígenas estariam desaparecidos. Nas redes sociais, internautas levantam a hashtag (palavra-chave) #cadeosyanomami como forma de atrair atenção da sociedade e exigir a apuração do caso. 

Após as denúncias, uma equipe formada pela Polícia Federal (PF), o Ministério Público Federal (MPF), a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), com o apoio do Exército e da Força Aérea brasileira, foi deslocada na quarta-feira (27) até a comunidade Aracaçá, região de Waikás, na TI Yanomami, em Roraima. Por meio de uma nota, a PF afirmou não ter encontrado “indícios da prática dos crimes de homicídio e estupro ou de óbito por afogamento, conforme denúncia do Conselho Distrital de Saúde Indígena". Entretanto, um vídeo feito por integrantes do Condisi-YY mostra a comunidade sob cinzas e nenhum vestígio das e dos indígenas que viviam no local. A Terra Indígena Yanomami foi demarcada e, depois, homologada em maio de 1992. 

Denúncia 
Na noite do dia 25 de abril, Júnior Hekurari Yanomami, presidente do Condisi-YY, denunciou por meio de um vídeo, que uma menina de 12 anos teria sido vítima de violência sexual e foi a o óbito durante um ataque dos garimpeiros na comunidade. Segundo Hekurari, com base em informações recebidas via rádio de pessoas da região, uma mulher e uma criança também estariam desaparecidas. Já no dia 29 de abril, o Condisi-YY relatou o sequestro de um indígena Yanomami recém-nascido por um garimpeiro, que alegou ser o pai da criança.

A região de Waikás possui forte presença de garimpeiros e registrou o maior avanço de exploração ilegal de minérios, de acordo com o relatório “Yanomami Sob Ataque: Garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e propostas para combatê-lo”, lançado pela Hutukara Associação Yanomami (HAY), em abril deste ano.  Segundo dados extraídos do documento, em 2021 o garimpo ilegal avançou 46% em comparação com 2020. De 2016 a 2020, o garimpo na TIY cresceu nada menos que 3.350%, ressalta o levantamento.  Estudos conduzidos, em 2014, pela Fundação Oswaldo Cruz, a pedido das comunidades, constatou que 92% dos indígenas da comunidade de Aracaça apresentaram índices elevadíssimos de mercúrio no sangue. 

Os documentos também apontam que o garimpo é responsável pela desestruturação, aliciamento e abuso sexual nas imediações das comunidades indígenas, o que aponta que o recente crime cometido contra a menina Yanomami não é um caso isolado. Em 2020, foram registrados crimes de violência e abuso sexual e mortes cometidos por garimpeiros a outras meninas Yanomami. 

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Norte I manifestou solidariedade ao povo Yanomami por mais esse trágico acontecimento em um “terrível cenário que vem se estendendo há anos”.  “A livre circulação, pelas florestas, rios e nas comunidades dentro da TIY, de homens a serviço do garimpo, fortemente armados, gera insegurança a quem se opõe ao garimpo, inibindo os indígenas de circularem livremente pelo território e impedindo a normalidade das atividades diárias de auto sustentação e até de visitação entre comunidades. Os impactos socioambientais decorrentes da invasão garimpeira se multiplicam, comprometendo o acesso ao ambiente adequado, à alimentação saudável e à água potável. A contaminação das águas por mercúrio, diretamente associada ao garimpo, causa danos irreversíveis à saúde”, afirmou o Cimi, por meio de nota.  

“Apesar de tantas denúncias e de tantos crimes, mesmo com sucessivas decisões judiciais proferidas em diversas instâncias do Poder Judiciário brasileiro desde 2018 e da adoção de Medidas Cautelares por parte da Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 2020, todas elas obrigando a União a atuar na proteção e monitoramento da TI Yanomami, incluindo a retirada dos garimpeiros e o controle do suporte logístico e empresarial da atividade ilegal, o Estado brasileiro persiste na omissão e na realização de operações pontuais claramente ineficientes”, completou. 

O Conselho pede em regime de urgência a adoção de medidas de proteção ao povo Yanomami e ao seu território, com a retomada de estratégias de Proteção Territorial que sejam consistentes e capazes de deflagrar operações regulares de desmantelamento dos focos de garimpo, a manutenção das Bases de Proteção Etnoambientais nos locais estratégicos, entre outras que também foram apresentadas no relatório da Hutukara Associação Yanomami. 

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) também se manifestou sobre o caso nas redes sociais. Nessa terça (03), indígenas brasileiros e lideranças comunitárias das regiões do Xingu e Tapajós na Amazônia viajou para a Europa, para se reunir com autoridades da União Europeia, divulgou a Apib. A delegação irá as invasões de seus territórios por mineradoras, como a canadense Belo Sun e por garimpeiros, que desempenham um grande papel no genocídio dos povos indígenas e ecocídio da Amazônia.

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