Nota da Adusp: Segurança na USP requer ações e diálogo efetivos

Desde 27 de outubro de 2011 muito se tem falado sobre a presença da Polícia Militar no campus do Butantã; pouco sobre segurança. Muito se tem falado sobre as ocupações do prédio da Administração da FFLCH e da Reitoria; pouco sobre as diferenças entre as duas ações.
A questão da segurança no campus não pode, simplesmente, ser reduzida a um plebiscito: sim ou não à presença da Polícia Militar. Ela merece uma reflexão mais profunda.
Diante da comoção causada pelo assassinato de um estudante no campus Butantã, em maio último, seria de se esperar que todos desejássemos medidas imediatas, capazes de impedir que novas tragédias viessem a ocorrer. A resposta dada pela Reitoria, de firmar o convênio que trouxe a PM cotidianamente para o campus, não é, a nosso ver, nem a melhor nem a única resposta às nossas necessidades de maior segurança.

Acreditamos que a USP, enquanto instituição de caráter educacional, tem o dever de ser exemplar no que se refere à questão da segurança, entre outras tantas. Na perspectiva já apontada por diretores do DCE, pensamos que a Guarda Universitária, assim como qualquer outro setor essencial à Universidade, não deveria de modo algum ter parte de suas funções delegada pela Reitoria a funcionários terceirizados, como ocorre atualmente.Deveria, isto sim, ser ampliada, formada por funcionários concursados, com forte vínculo com a instituição, integrantes da comunidade de cuja segurança estarão ocupados, preparados para lidar com a diversidade que caracteriza qualquer sociedade e, em especial, a Universidade.

Efetivo feminino

A Guarda Universitária deveria contar com um efetivo feminino, para lidar com casos específicos de violência contra a mulher. Deveria priorizar a prevenção e não a repressão. Além disso, medidas básicas como iluminação adequada de todo o campus e melhoria no sistema de transporte interno, com aumento da frota dos ônibus circulares e extensão do seu trajeto, para chegar à Estação Butantã do Metrô, deveriam ser prioridades. Se a Guarda deve ou não ser armada; em que circunstâncias a Polícia deve ser chamada a intervir - são aspectos importantes, que precisam ser debatidos com muito cuidado pela comunidade.
Nada disso ocorreu: nem as ações óbvias, nem o debate das questões sensíveis e complexas.
O atual convênio sequer foi discutido com o Conselho Universitário (Co), muito menos com representantes de estudantes, funcionários e docentes. Firmado há apenas 60 dias, já mostra seu potencial de conflito, levantando com mais vigor a necessidade da discussão ampla com a comunidade sobre sua adequação. Se não, vejamos.
Como reação a uma ação da PM, que pretendia deter e conduzir a uma delegacia de polícia estudantes que estariam fumando maconha em um carro no estacionamento da FFLCH, estudantes reunidos em assembleia, dirigida pela diretoria do DCE Livre da USP, deliberaram por ocupar o prédio da administração da faculdade. Vale ressaltar que, mesmo tendo defendido outra proposta, a diretoria do DCE acatou a decisão da assembleia e se propôs a participar das comissões estudantis, responsáveis pela organização da ocupação, tendo sido impedida de fazê-lo.

Legitimidade

A nosso ver, a ocupação na FFLCH teve a legitimidade de uma deliberação democraticamente tomada pelos estudantes, em suas instâncias. Isso não significa, no entanto, concordância com tal decisão: trata-se de aspectos distintos da questão. Uma coisa é reconhecer como legítima determinada ação do movimento estudantil; outra, bastante diferente, é concordar com ela ou considerá-la resposta adequada ao momento.
A decisão tomada pela assembleia estudantil, no contexto de crescente indignação com a postura autoritária da Reitoria, pode ser questionada mas não deslegitimada, tendo trazido à tona a necessidade de uma discussão mais ampla sobre o tema da segurança e sobre o modo como a Reitoria tem se relacionado com os diferentes setores da universidade.
A manifestação da diretoria da Adusp, encaminhada aos docentes na manhã de 31/10, deixou clara sua posição crítica com relação ao convênio firmado entre a USP e a Secretaria de Segurança, e indicou parâmetros que deveriam nortear a discussão democrática sobre o tema da segurança no campus, sem entrar no mérito da deliberação da assembleia estudantil realizada em 27/10.
No entanto, não podemos nos furtar de tomar posição com relação à atual ocupação da Reitoria, que teve início na madrugada de 2/11. Reunidos em assembleia no dia 1/11, cerca de 1.000 estudantes deliberaram, majoritariamente, pela desocupação da FFLCH. Insatisfeito com o resultado da votação, após o encerramento dessa assembleia um grupo minoritário decidiu ocupar a Reitoria, em flagrante desrespeito à entidade representativa dos estudantes e a seus instrumentos de deliberação. Trata-se de uma decisão que não encontra respaldo em nenhuma das instâncias do movimento estudantil, carecendo, portanto, de legitimidade. Não se pode reivindicar democracia e, ao mesmo tempo, desprezá-la, quando seus resultados não são os esperados.

Diálogo e sensatez

Apesar disso, entendemos que o conflito posto deva ser resolvido por meio do diálogo e da força da sensatez; e não por desocupação violenta, com uso da tropa de choque da PM. O modo de atuação dessa corporação, dentro ou fora da universidade, não indica que ela esteja efetivamente preparada e orientada para atuar na perspectiva da garantia dos direitos de cidadania e do respeito para com a pessoa humana, como seria de se almejar.

Finalmente, mas não menos importante, é preciso que a Reitoria entenda a necessidade de diálogo constante e efetivo com as entidades representativas de docentes, estudantes e funcionários. Não basta fazer reuniões com Adusp, Sintusp ou DCE. É preciso que desses encontros resultem propostas e encaminhamentos para os muitos problemas que afetam a vida universitária. É preciso ouvir. É preciso dar continuidade e consequência aos processos de negociação que são iniciados.
A Reitoria não pode, unilateralmente, tomar decisões que afetam a vida daqueles que trabalham e estudam na Universidade de São Paulo, especialmente sobre um tema tão delicado quanto a segurança no campus. A questão precisa urgentemente ser debatida pela comunidade e os procedimentos a serem adotados devem emergir de tal debate. Sob pena de se multiplicarem os conflitos, com consequências imprevisíveis.

Diretoria da Adusp

São Paulo, 07 de novembro de 2011