Greve de 2012 dos docentes federais passa a ser a mais longa da história do setor

A intransigência e descaso do governo frente às reivindicações dos docentes das Instituições Federais de Ensino (IFE) fizeram com que a greve deste ano atingisse nesta quinta-feira 113 dias, superando a paralisação de 2005, até então considerada a mais longa realizada no setor.

“A extensão da greve é um marco, mas não o mais importante. Só optamos por esse instrumento de pressão por que o governo está de costas aos docentes e à educação federal”, avalia Marinalva Oliveira, presidente do ANDES-SN.

Para Marinalva, a força e coesão com a qual o movimento se iniciou e se mantém é o fator mais relevante e que permitiu expor à sociedade as condições precárias das IFE e a forma como o professor é desvalorizado pelo governo.

“Nossa greve foi a fagulha para o estopim de um movimento mais amplo que culminou numa greve articulada em todo o setor da Educação. Não tem precedente uma greve como esta, iniciada com o grau de adesão ao movimento, participação qualitativa no debate político. Docentes, técnicos e estudantes, tanto de graduação quanto de pós, saíram às ruas em defesa do ensino público federal de qualidade”, analisa.

Desde o final de 2010, os professores organizados na base do ANDES-SN vêm buscando negociar com o governo federal a reestruração da carreira docente para, com base em conceitos definidos, valorizar a atividade docente, torná-la estável e atraente, para ingresso e permanência, e, desta forma, resgatar direitos que foram usurpados dos professores ao longo dos últimos 20 anos.

Tão importante quanto a reestruturação da carreira é a segunda reivindicação da pauta da greve dos docentes das IFE: melhoria nas condições de trabalho. Esta se quer foi objeto de análise por parte do Executivo nas mesas de negociação, muito menos contemplada no simulacro de acordo firmado pelo governo.

Após a suspensão unilateral das negociações no início de agosto, o Comando Nacional de Greve do ANDES-SN buscou diferentes canais para a reabertura do processo, inclusive apresentando uma contraproposta, na qual os professores adequaram os conceitos para a reestrutração da carreira aos valores de piso e teto definidos pelo governo, em mais uma demonstração de disponibilidade para a negociação.

Apesar de todos os movimentos feitos pelos docentes, os representantes do Ministério da Educação e do Planejamento se mantiveram irredutíveis, demonstrando que as divergências vão muito além de questões financeiras, envolvem também o projeto de Educação Federal que se pretende para o Brasil.

“Estamos vivenciando a desconstrução, por parte dos sucessivos governos, da educação pública como um direito social no sentido mais pleno que a palavra pública pode ter. Para isso, buscam redefinir o papel das Instituições Federais de Ensino e da atividade docente. Promove-se a expansão quantitativa, mas não qualitativa, incentiva-se o produtivismo e a individualização dos profissionais, buscando retirar do fazer acadêmico toda sua característica artesanal e as especificidades das áreas do saber. As IFE passam a preparar para o mercado, de forma imediatista e precária, e não mais para a vida”, reflete a presidente do ANDES-SN.

Carreira
A carreira, contida no Plano de Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos, foi conquistada em 1987 pela força da luta da categoria. Com o objetivo de ser gerida no âmbito da autonomia universitária, previa o estímulo ao desenvolvimento do docente de forma equilibrada, considerando o tempo de serviço, a formação continuada, a avaliação do plano de trabalho no espaço acadêmico coletivo e a valorização da Dedicação Exclusiva como regime de trabalho preferencial.

Entretanto, ao logo dos anos, alterações impostas pelos governos, desde o mandato de Fernando Collor de Melo, têm conseguido desconfigurar a carreira, retirando direitos dos professores. A tabela salarial foi mantida congelada desde 2010 e a composição remuneratória, que antes seguia uma lógica conceitual e matemática, foi desfacelada.

“Com isso, algo que deveria ser óbvio como o salário de alguém que trabalha 40 horas ser o dobro de quem trabalha 20 horas, no mesmo nível da carreira, não se aplica mais à nossa carreira. É contra esse processo de desconstrução da lógica de nossa carreira que lutamos e em defesa dela que estamos em greve”, explica Marinalva.

Infraestrutura
O processo de precarização do trabalho docente caminha ao lado da desestruturação da carreira e foi aprofundado com a expansão das IFE, a partir de 2008, através do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Faltam estruturas adequadas como salas de aulas, bibliotecas, laboratórios, restaurantes universitários, residência estudantil, além de profissionais para atender ao aumento no número de ingressantes.

“Sempre defendemos a ampliação do acesso à educação, com vistas a sua universalização, mas isso tem que ser feito com a contrapartida de investimentos concretos em infraestrutura, contratação de professores e técnicos efetivos, através de concurso público. O que só vai ocorrer quando a Educação for realmente uma prioridade do Governo e tratada como um compromisso de Estado”, declara Marinalva.

Fonte: Andes-SN