Residência estudantil é essencial para a permanência dos estudantes na Uesb
O campus de Itapetinga fez o debate no dia 23.08.19

Em tempos de retirada de direitos e empobrecimento da população, é cada vez mais necessário construir uma política forte de permanência estudantil, para que seja possível aos filhos da classe trabalhadora concluírem seus cursos. Nesse sentido, a moradia estudantil é essencial. Para dialogar com a comunidade acadêmica sobre esse assunto, o grupo de trabalho de políticas educacionais da Adusb (GTPE) promoveu a roda de conversa “A residência universitária sob o olhar dos residentes”, nos três campi da Uesb.

Os debates foram iniciados com a apresentação da dissertação “A resistência dos residentes: condições de permanência na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia”, da assistente social Marília do Amparo. Atualmente a Uesb possui moradia estudantil apenas no campus de Vitória da Conquista, com 26 vagas. Marília ressaltou que “a residência estudantil da Uesb não se deu a partir de benesse nenhuma dos gestores e sim a partir da luta do movimento estudantil, assim como todas as políticas públicas”.

Atividade realizada no campus de Vitória da Conquista em 28.08.19

A luta de forma mais efetiva pela moradia estudantil foi iniciada em 2004, quando os estudantes ocuparam a reitoria por 10 horas e realizaram uma feijoada-protesto. Por fim, decidiram pela ocupação do prédio da Uesb, onde hoje funciona o Sistema Universitário de Rádio e Televisão Educativas (SURTE), mas que na época estava desocupado.

Cinco meses depois, a reitoria, sem tomar nenhuma providência efetiva para atender a demanda dos estudantes, preferiu criminalizar a vulnerabilidade socioeconômica dos estudantes e entrou com um pedido de reintegração de posse do espaço. Uma liminar foi concedida à universidade, com multa diária de R$ 1 mil por estudante. Houve processo de intimidação ao movimento, bem como corte de água e luz. Uma negociação foi feita para a entrega parcial do prédio.

A ocupação teve continuidade e durou por quatro anos, uma das maiores da américa-latina. Os estudantes voltaram a ser acionados pela Justiça em 2008, dessa vez com a penalidade de multa diária de R$ 2 mil reais por estudante, caso a ocupação não fosse concluída. Novas mobilizações foram promovidas e culminaram no acordo de desocupação com o arquivamento dos processos, entrega do módulo da residência universitária com 32 vagas e compromisso de construção das moradias estudantis nos campi de Jequié e Itapetinga. Ainda em 2008 foi pautado no Conselho Superior Universitário (CONSU) proposta de resoluções para construção do Programa de Assistência Estudantil da Uesb (PRAE) e da residência universitária.

Roda de conversa em Jequié no dia 30.08.19

Ivana Santos, residente há três anos da moradia estudantil da Uesb, considerou a residência universitária como uma política fundamental para os estudantes. Revelou ainda que muitos estudantes que residem atualmente ou que já passaram pela moradia não teriam condições de se formarem se não tivessem moradia garantida pela universidade.

A realidade apontada pela estudante também foi retratada pela pesquisa de Marília, que criticou o número insuficiente de vagas em Vitória da Conquista e a inexistência das moradias em Jequié e Itapetinga. “Quando analisamos as políticas públicas no geral percebemos isso. Não vai ser universal. Não vai ser para todos. Não é para a permanência, para conclusão de fato dos cursos é sempre no intuito de amenizar. As políticas públicas, no contexto do capitalismo, são sempre no sentido de amenizar, de conceder o mínimo dos direitos básicos”, afirmou a assistente social.

Apesar de ser considerada uma vitória importante do movimento estudantil, a moradia universitária possui problemas graves, que foram denunciados por residentes. Há goteiras, infiltrações, mofo, falta espaço adequado para estudo e convivência, manutenção da área externa e uma política adequada para a ocupação das vagas emergenciais. Além disso, Ivana denunciou as dificuldades que os residentes sentem ao terem que expor suas fragilidades de forma cotidiana à universidade.  “Você tem que demonstrar que você não está conseguindo acompanhar a turma. Porque se você perder em duas disciplinas não pode continuar [na residência]. Você tem que provar quando você não está tão bem [psicologicamente]”, contou a residente. Ivana considerou como humilhante a exigência da universidade de comprovação recorrente de vulnerabilidade econômica, pois “você tem que continuar provando que você é pobre, que você não ‘enriqueceu’ de uma hora para outra na residência”, o que gera sofrimento aos estudantes, contou a residente.

Para a vice-presidente da Adusb, Iracema Lima, é papel do movimento docente discutir sobre permanência estudantil, pois se não há alunos, não há universidade. A professora chamou atenção para o fato de que todos os residentes presentes na pesquisa “são os primeiros da família a ingressarem no ensino superior. É visível o quanto essa formação vai modificar não só a vida do sujeito, mas impacta também em desdobramentos na vida da família como um todo”. Isso mostra que a juventude trabalhadora continua a ter dificuldades para ingressar e também se manter no ensino superior. “Em 2008 foi apresentado o horizonte de residência universitária em Jequié e Itapetinga. Lá se vão 11 anos e não tem sequer, até onde eu sei, um desenho, uma planta que seja. Enquanto isso estudantes estão largando a universidade”, disse Iracema. A defesa do debate da residência universitária e da permanência estudantil como um todo nos conselhos universitários foi defendida, pois “temos que pensar como que a gente, enquanto parte constitutiva desta comunidade acadêmica, qual o nosso papel para fazer com que este debate volte ao ponto de pauta nos conselhos superiores. É necessário que os conselhos superiores não entendam apenas ao lado burocrático, institucional, mas entendam também o funcionamento deste corpo que se movimenta, que dá vida a essa universidade”.