Preocupações com a precarização do trabalho, inclusão social e qualidade do ensino marcam debate sobre ensino remoto

O ensino remoto foi tema da reunião ampliada da Adusb da sexta-feira (3). Filiadas e filiados presentes apresentaram considerações e preocupações relacionadas ao tema. Garantia das condições de trabalho, inclusão social e qualidade de ensino foram alguns dos princípios considerados fundamentais para qualquer proposta que venha a ser construída no âmbito da universidade. Uma nota da diretoria da Adusb com a apresentação do debate realizado foi publicada no domingo (5) e enviada para conhecimento de toda comunidade universitária. O Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão da UESB (CONSEPE) se reunirá virtualmente no dia 9 de julho para discutir ensino remoto.

Leia na íntegra a nota da diretoria.

Sem caráter deliberativo, a reunião teve como objetivo escutar a categoria e subsidiar a atuação da diretoria da Adusb no que se refere ao ensino remoto, pois há proposta da Reitoria da UESB de implementação dessa modalidade de ensino. A diretoria da Adusb tomou todas as medidas de segurança para garantir a participação de docentes filiados, bem como impedir a invasão de terceiros na plataforma utilizada para a reunião e evitar exposição indevida de intervenções ou imagens. A reunião foi amplamente divulgada nas redes sociais da Adusb e também pela mala direta. Filiadas e filiados interessados em participar enviaram e-mail com a solicitação para o e-mail da secretaria da Adusb e o link foi encaminhado minutos antes do início da reunião, com autorização manual da secretaria no momento de entrada. Dois intérpretes de libras também acompanharam todo debate para viabilizar a acesssibilidade aos sindicalizados.

Garantia das condições de trabalho

Uma das principais preocupações apontadas pela categoria é a manutenção das condições de trabalho, caso o ensino remoto venha a ser adotado pela universidade. Com mais de 100 dias desde a suspensão das atividades presenciais na UESB, o trabalho remoto já é uma realidade, uma vez  que as atividades administrativas, de orientação, de pesquisa e de extensão estão em pleno funcionamento.

Professoras e professores relataram aumento de jornada de trabalho, exaustão física e mental relacionado às atividades laborais. A suposta flexibilidade de horário na verdade se transforma em aumento da precarização. Preocupa a falta de infraestrutura para a oferta do ensino remoto, já que a modalidade exige equipamentos, condições, técnicas e recursos didáticos específicos.

Com a pandemia a situação se agrava, pois muitos docentes, especialmente as mulheres, estão responsáveis pelo cuidado de familiares que são grupo de risco e de crianças em casa. Dessa forma, qualquer discussão sobre adoção do ensino remoto deve levar em conta as mais diversas realidades das professoras e dos professores.

Inclusão social

A categoria não tem qualquer dúvida do papel da universidade pública enquanto agente de inclusão social. Neste sentido, considera imprescindível que ninguém seja excluído - estudantes, docentes e técnicos - em qualquer proposta de ensino remoto, o que perpassa inevitavelmente pelo aporte de recursos para políticas de inclusão.

De acordo com estudo dos docentes Felipe Watarai e Maíra Avelar, realizado a partir do "Questionário Diagnóstico de Acessibilidade a Tecnologias Digitais", elaborado pela Prograd/Reitoria, 3.650 estudantes não possuem acesso adequado à internet em suas casas e 2.638 estudantes não possuem equipamento adequado, para acompanhar aulas remotas.

Conheça a análise dos dados.

Há preocupação sobre como a universidade supriria essa demanda, pois segundo informações da Reitoria, durante a reunião do Conselho Superior Universitário (CONSU) do dia 19 de junho, a situação orçamentária da UESB é dramática. Em abril e maio não houve repasse na rubrica geral das verbas de manutenção e custeio. O contingenciamento acumulado de janeiro a março foi de 17,42% e o represamento mensal dessas verbas foi de 41,82% em abril a 49,18% em junho. O CONSU chegou até mesmo a suspender o contrato com a empresa que presta serviços ao Núcleo de Acessibilidade e Inclusão de Pessoas com Deficiência (NAIPD). A universidade apresenta enormes dificuldades de seguir em funcionamento. Os docentes se perguntam como o ensino remoto pode ser adotado diante desse cenário de escassez de recursos.

Em nota publicada pelo Diretório Central dos Estudantes da UESB, campus Vitória da Conquista, nesta segunda-feira (6), os dicentes apresentam preocupações similares, pois entendem que “tomar qualquer decisão sem possuir todas as garantias para que o processo do ensino remoto funcione adequadamente é colocar o futuro de mais de oito mil discentes de graduação em risco. Logo, qualquer proposta que vise aprovar as aulas virtuais para depois começar a estruturar meios para alcançá-las deve ser encarada como imprópria, uma vez que não se pode depender de incertezas para sustentar qualquer trabalho”.

Qualidade de ensino

Durante a reunião ampliada, os presentes consideraram que a forma mais adequada de garantir a qualidade de ensino seria o retorno das atividades presenciais, com as devidas condições de biossegurança. No entanto isso não é possível no momento.

Muitos docentes se mostraram extremamente preocupados em como realizar seu trabalho com qualidade, caso o ensino remoto seja aprovado. Dados da pesquisa realizada pela UESB apontam que 45,1% dos professores que responderam ao questionário nunca utilizaram ambiente virtual de aprendizagem e 39,2% têm pouca ou nenhuma experiência com uso dos recursos tecnológicos especificamente associados ao ensino remoto. Apenas 13,1% dos professores afirmaram ter ampla experiência com uso de tais recursos tecnológicos. Portanto, além da oferta de internet e computadores para os estudantes, há também uma grande demanda de formação para que professoras e professores possam desenvolver suas atividades.

Saiba mais sobre a pesquisa da UESB.

A diversidade entre os cursos da universidade também foi abordada durante a reunião. Uma proposta de ensino remoto deve dar conta de atender as especificidades das áreas, muitos cursos possuem caráter altamente prático, exigem debate teórico conjunto ou mesmo ficam prejudicados, caso haja proposta de desassociar, mesmo que temporariamente, teoria e prática.

Transitoriedade e discussão democrática

Em consonância com as indicações do ANDES-SN, a reunião ampliada entendeu que qualquer debate sobre ensino remoto deve vir assegurado de que se trata de uma demanda transitória, devido à pandemia. Em hipótese alguma os governos podem se aproveitar deste momento de excepcionalidade para tentar substituir o ensino presencial pelo ensino remoto, no pós-pandemia.

A categoria também defendeu a discussão democrática sobre ensino remoto e qualquer outro tema fundamental à vida universitária. Apresentou também críticas ao calendário proposto pela Reitoria da UESB , divulgado no dia 30 de junho para já ser votado no dia 9 de julho, com a indicação pela administração da data de 10 de agosto para começo das aulas remotas. Mesmo com a apresentação do período de início do ensino remoto, não há ainda nenhuma proposta concreta de como e com quais recursos efetivamente essa modalidade pode ser implementada na UESB.

Na avaliação do vice-presidente da Adusb, Alexandre Galvão, a reunião comprovou que “mesmo em condições desfavoráveis, é possível reunir a categoria para um debate qualificado. A presença de um grande número de professoras e professores  demonstrou o interesse e a confiança no sindicato em discutir um tema tão delicado, que interfere na vida laboral de todas e todos. Assim, após a essa experiência, a diretoria entende que é possível ouvir as o os docentes, mesmo em espaços não deliberativos, para fortalecer a atuação da Adusb na defesa dos direitos trabalhistas”.