Fundo de previdência deve ampliar retirada de direitos dos servidores estaduais

A divulgação feita na última semana de que a Caixa Econômica Federal (CEF) deve criar um grande fundo de previdência complementar para administrar as pensões dos servidores de estados e municípios evidencia o esforço dos governos na retirada crescente dos direitos previdenciários destes trabalhadores, além de eximir o Estado da responsabilidade em garantir os benefícios aos servidores. Assim como o Funpresp, o Prev-Federação será vinculado às regras do mercado, e não garante ao servidor o acesso ao benefício quando este se aposentar.
 
“Esta é uma ampliação do modelo aplicado no Funpresp, que funciona como um fundo estritamente financeiro, sujeito às regras de mercado, sem nenhuma garantia em relação ao benefício, nem por parte do fundo de pensão e nem por parte do Estado. Se o fundo for mal, o governo não banca”, explica a coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lucia Fattorelli.
 
Um relatório do grupo técnico criado na Caixa para estudar uma proposta do Ministério da Previdência, obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo, é favorável à criação do fundo. Segundo a reportagem, os técnicos recomendaram a operação ao presidente da Caixa, Jorge Hereda. O universo potencial do Prev-Federação é de 460 mil funcionários públicos de estaduais e municipais, que recebem acima do teto do INSS, atualmente em R$ 4,4 mil por mês, ainda de acordo com O Estado de S. Paulo.
 
Fattorelli explica que, em âmbito federal, até o advento do Funpresp, não existia fundo financeiro para os servidores públicos. Já nos estados, desde a emenda constitucional 20/98, estes ficaram obrigados a criar fundos de seguridade que envolviam previdência, assistência e saúde. “Apesar de ser um fundo financeiro, os criados com a emenda 20/98 garantiam uma série de benefícios e o estado ficava responsável no caso de problemas em relação ao fundo, com uma série de garantias. Os fundos ora propostos, à semelhança do Funpresp, são meramente financeiros, sob a modalidade de contribuição definida, ou seja, não dão garantia quanto ao valor dos benefícios, que ficarão sujeitos ao comportamento do mercado financeiro. Isso traz uma imensa vulnerabilidade por conta do período que estamos vivendo, do capitalismo financeirizado, e completa desregulamentação financeira, que permite uma verdadeira farra na criação de ‘produtos’ financeiros”, diz.
 
Para a coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, o grande risco destes fundos é a aplicação em derivativos que deixam os participantes totalmente inseguros. Tal aplicação é permitida pela Resolução 3.792/2009, do Conselho Monetário Nacional, cujo artigo 44 diz que “as EFPC [Entidades Fechadas de Previdência Complementar] podem realizar operações com derivativos”. “Depois da crise de 2008 ficou muito claro que a maioria desses derivativos sequer tem lastro e se transformam em ‘papel podre’ da noite para o dia. Os derivativos surgiram com a desregulamentação do mercado financeiro, e funcionam como uma especulação futura, uma mera aposta. Nesse caso, como ficará a segurança dos servidores estaduais e municipais que aderirem ao fundo? É totalmente diferente da natureza dos fundos que já existiam a partir da emenda 20”, esclarece.
 
“É difícil compreender porque estas e outras iniciativas são tomadas pelo governo, porque elas são claramente contrárias aos interesses dos brasileiros, mas ao pesquisar a origem destas ações, aí encontramos uma explicação. A determinação para este tipo de previdência baseada em conta financeira individual consta na carta de intenções do FMI de 1998, e ela fala claramente da criação dos fundos de previdência”, afirma Fattorelli. Segundo ela, o memorando de políticas econômicas afirma que contas individuais serão estabelecidas para os participantes tanto do setor privado quanto do público, e “isto representa o compromisso de criação de fundos de previdência, por meio de contas individuais”. “Depois, houve um empréstimo do Banco Mundial para assessorar a criação dos fundos de pensão nacional e sub-regionais, ou seja, nos estados, cujo objetivo é 'obter significativas reduções dos custos de aposentadoria', indicando claramente que haverá prejuízo aos beneficiários”, acrescenta.
 
De acordo com O Estado de S. Paulo, a criação do Prev-Federação interessa à capital de São Paulo e também a outros cinco estados – Minas Gerais, Ceará, Espírito Santo, Rondônia e Pernambuco -, que já aprovaram leis reformando os regimes próprios de aposentadoria. Apenas a União, com o Funpresp, e os Estados de São Paulo e do Rio de Janeiro contam com fundos de previdência complementar, criados em 2013.

O futuro Prev-Federação seguirá as mesmas regras desses três fundos, segundo à reportagem. Com o novo regime previdenciário, a aposentadoria dos servidores públicos estaduais e municipais terá como limite o teto do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Se desejar receber além do teto atual de R$ 4,4 mil por mês, o servidor no novo regime deverá aportar parte de seu salário em um fundo de pensão - o Prev-Federação, nos estados e municípios que aderirem à ideia. O novo fundo poderá aplicar no mercado, em renda fixa (títulos públicos e debêntures) e também em projetos de infraestrutura.

“Na atual conjuntura, é um abuso a criação deste tipo de fundo. A colocação deste modelo de previdência ao servidor, vinculado a papéis de risco, não tem nem sentido semântico. Se olharmos no dicionário o que significa a palavra previdência verificamos que é sinônimo de segurança. Qual o sentido de colocar a segurança futura dos servidores em aplicações de risco? A modalidade de fundo de pensão sujeita a regras do mercado financeiro, em tempos de desregulamentação total, é uma temeridade para o futuro dos trabalhadores”, ressalta Fattorelli.

* Com informações do O Estado de S. Paulo

Fonte: ANDES-SN