20 de novembro: dia da Consciência Negra, por reparações históricas, ditadura nunca mais!
Arte: CSP - Conlutas

Desde a década de 70, o Movimento Negro Brasileiro tem celebrado a imortalidade de Zumbi, reconhecido como uma das maiores lideranças negras da história do Brasil, à frente do maior símbolo de resistência negra do país – o Quilombo de Palmares.

No calendário de memória da negritude e das lutas sociais, o mês de novembro ficou consagrado como “Novembro Negro”, por celebrar a resistência heroica de Zumbi, o “Dia Nacional da Consciência Negra” e o início da Revolta da Chibata, liderado por João Cândido no dia 22 de novembro de 1910 no Rio de Janeiro. Esses fatos históricos não deixam dúvidas de que sempre no país houve lutas e resistências do povo negro contra a escravidão e o racismo. São os heróis da plebe recolocados no seu devido lugar, como dizia Clóvis Moura.

Luiza Mahin, Dandara, Antônio Conselheiro, Negro Cosme são heroínas e heróis anônimos que fizeram deste país, um país de revoltas em todos os cantos. Não esqueceremos da célebre frase de Luiz Gama, em pleno tribunal de júri, defendendo um escravo: “O escravo que mata seu senhor pratica um ato de legitima defesa”. Assim como Malcolm X que imortalizou sua frase em defesa incondicional da libertação negra nos Estados Unidos, afirmando que ela poderia se dar “por qualquer meio que se faça necessário”.  Esses são fatos e exemplos de nossas referências de organização e luta nos territórios, campo e cidade.

Figuras como do subtenente do Exército Hélio Barbosa Lopes, deputado eleito recentemente pelo PSL do Rio e que adotou o sobrenome de Bolsonaro, bem como de Fernando Holiday, do Movimento Brasil Livre, não servem a nós, muito menos a nossa luta. O primeiro, foi figura ilustrativa ao lado de Bolsonaro durante a campanha eleitoral, passando a ideia de que este representante da Casa Grande não era racista, pois tinha do seu lado um negro, enquanto dizia as piores sandices e disseminava ódio racial contra quilombolas e indígenas, discriminava mulheres e LGBTs. Chegou a comparar quilombolas a animais, quando se referiu ao peso de um quilombola, sugerindo a equivalência da medida de massa usada em animais (arroba), bem como disse que “não serve nem para procriar”. Chamou os haitianos, senegaleses, bolivianos e sírios, de “escória” do mundo, destacou também que caso eleito iria acabar com a demarcação de terras.

Já Holiday, do Movimento Brasil Livre, tem cumprido a tarefa de se colocar contra a luta negra. Disse que é contra o Dia Nacional da Consciência Negra, ataca Zumbi, é contra as cotas e a favor da redução da maioridade penal. Para ele, nossa luta é “vitimismo”.

Figuras como essas não são nossas referências e nunca serão, agem para confundir a cabeça de nosso povo, tentam desconstruir nossos signos e elementos de nossa resistência e luta, empenham-se em ridicularizar as nossas lutas, servindo de bucha de canhão da elite branca e racista deste país.

 

20 de Novembro e os 130 anos de Abolição sem Reparações

Em maio deste ano completaram-se exatos 130 anos da abolição da escravidão no país. Uma abolição sem reparações ao povo negro e que oficialmente difundiu a ideia de abolição humanitária, com a princesa Isabel como “benevolente”. A ilusão na democracia racial foi forjada no pós-abolição. Foram, enfim, muitas tentativas para esconder o racismo instituído no país.

A escravidão durou quase quatro séculos, mas foi oficialmente abolida sem reparar o maior crime que o capitalismo cometeu: foram mais de 50 milhões indígenas eliminados na América e mais de 20 milhões de africanos escravizados, a maioria vindo para o Brasil. Entre 40% e 50% perdiam suas vidas nos portos africanos ou na travessia do Atlântico.

A escravidão transformou homens e mulheres negras em peça para acumulação do capital, os traficando e submetendo a todo tipo de exploração, opressão e humilhação. As mulheres negras foram transformadas em objeto sexual, força de trabalho que cumprem o papel para servir. A miscigenação tão apregoada como “símbolo da nacionalidade brasileira” foi à custa de estupros e violência das negras e indígenas.

A abolição nada tem de benevolente. Além de tardia, visto que o Brasil foi o último país a revogar a escravidão, ocorreu quando havia apenas 5% da população ainda escrava, o que tornava impraticável manter esse sistema.

A escravidão foi sendo paulatinamente corroída, de um lado, pela resistência negra: diversas fugas, rebeliões, destruição de fazendas e construção de quilombos; por outro lado, pelas pressões da Inglaterra, ávida por lucro, por conta de seu projeto de industrialização que em essência exigia a modificação das relações de trabalho e ampliação do seu mercado consumidor.

A abolição foi realizada sem nenhuma política de reparações. O Estado português foi responsável pela escravidão africana, considerado o maior crime da história da humanidade. O Estado brasileiro deu prosseguimento a esse mesmo processo, mantendo a escravidão mesmo depois da independência do Brasil por mais 66 anos e pela exclusão do negro no pós- abolição. Os senhores também foram isentos de qualquer responsabilidade pelos séculos de escravidão e humilhação ao povo negro.

Não houve nenhuma medida de integração social do povo negro. Ao contrário, a partir desta lei, negros e negras foram obrigados a depender de sua própria sorte, vivendo em condições sub-humanas, sem terras, trabalho, educação e moradia digna.

Foi a partir dessa caracterização que o Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe, o Movimento Hip Hop Quilombo Brasil, o Moquibom, o Movimento Luta Popular, e outras entidades, em maio deste ano, tomaram a iniciativa de reafirmar a tradição da luta negra neste país considerando o 13 de maio como Dia Nacional de Luta contra o Racismo e não de comemoração, realizando no Rio de Janeiro e Maranhão marchas por reparações.

Neste mês de novembro, reafirmamos como mês da Consciência Negra no qual destacamos a urgência pelas reparações históricas: demarcação e titulação das terras quilombolas e indígenas, reforma agrária, desmilitarização da polícia, implementação da lei 10.639 (ensino nas escolas da história e cultura afro-brasileira), a ampliação da política de ações afirmativas, cotas nas universidades e serviços públicos, fim do racismo religioso, geração de empregos e renda, na suspensão do pagamento da dívida interna e externa, entre outras.

Acrescentamos a isso a nova conjuntura política que se abriu no Brasil com a eleição de Jair Bolsonaro para presidente. Um governo ultradireita, abertamente racista e contra as políticas de reparações para o povo negro e indígena. Trata essas políticas como “coitadismo” e promete que vai acabar com elas. Disse em seu discurso que vai propor ao Congresso Nacional reduzir o percentual de cotas nas universidades; não reconhece a dívida histórica por conta da escravidão no país, atribuindo ao próprio negro a responsabilidade pelo tráfico. Enfim, vamos ter de enfrentar esse governo desde o primeiro dia de seu mandato.

A Marcha da Periferia está se colocando como ponto de apoio para a reorganização de uma parcela importante de entidades do movimento negro, coletivos culturais e movimento popular, tendo em vista a necessidade de preparar a luta para enfrentar o próximo governo que irá tentar aprovar a Reforma da Previdência, o projeto d a Escola Sem Partido, privatizar empresas públicas e tantos outros ataques propostos, assim como promete endurecer ainda mais o regime. Não por acaso o tema da Marcha da Periferia deste ano é “REPARAÇÕES JÁ, DITADURA NUNCA MAIS!

Incorpore-se aos Comitês de sua região! Fortaleça a luta na base! Construa a Marcha da Periferia!

 

Por: Claudicéa Durans, do Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe