Absurdo: São anistiados os policiais que mataram 111 detentos no Carandiru (SP)
Foto: Patrícia Santos / Flickr Commons

A Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2821/21 que anistia os policiais militares processados ou punidos pelo massacre do Carandiru.

Para quem não lembra, mas é difícil esquecer, o massacre do Carandiru foi a violenta ação policial para conter uma rebelião devido à vida desumana que levavam os presos na Casa de Detenção de São Paulo. A trágica medida provocou a morte de 111 detentos em 2 de outubro de 1992.

As cenas dantescas resultaram no livro “Estação Carandiru”, do médico Dráuzio Varela, e no filme “Carandiru”, dirigido por Hector Babenco.

Justificativas que não justificam

O relator do projeto, o deputado Sargento Fahur (PSD-PR), deu parecer favorável à proposta do deputado Capitão Augusto (PL-SP), que justificou para o pedido que “os policiais que atuaram na ação policial ainda sofrem, passadas três décadas, perseguição política ideológica e enfrentam condenações sem a observância mínima das garantias constitucionais”, consta na Agência Câmara de Notícias.

Tamanha a gravidade do crime, os 73 policiais que atuaram no massacre foram condenados pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) a penas que variam de 48 a 632 anos.

​Segundo Sargento, a Justiça impôs penas gerais aos policiais não sendo possível individualizar a conduta ou determinar se houve excesso doloso ou culposo. Por este motivo não haveria respaldo constitucional para as condenações sem a demonstração de conduta individual certa e definida.

O mais grave da decisão é a justificativa do Sargento: “Pode-se afirmar que a operação para contenção da rebelião foi legítima e necessária para reestabelecer a paz naquele ambiente evidentemente caótico e violento e que os policiais antes de tudo atuaram como instrumento do Estado”, disse denominando os policiais criminosos como verdadeiros heróis e que deveriam ser condecorados pela “bravura que exige coragem que vai além dos riscos comuns da profissão”, consta da Agência.

O projeto será analisado agora pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) e pelo Plenário da Câmara.

Anistia aos amigos

Defensor declarado da ditadura militar, que matou, torturou e perseguiu milhares de brasileiros (1964 a 1985), Bolsonaro desde o início de sua gestão impôs um verdadeiro desmonte das políticas de reparação às vítimas do regime. Mas a anistia aos policiais criminosos do Carandiru expressam que para os amigos a anistia vale. Assim como vale para a repressão militar e policial.

No final de junho, o governo tentou extinguir a Comissão de Mortos e Desaparecidos, que tem como objetivo localizar, reconhecer e esclarecer as mortes e desaparecimentos frutos da repressão na ditadura.

O presidente da Comissão, Marco Vinícius Pereira de Carvalho, havia convocado para o último dia 28 uma reunião para votar o relatório final e determinar o encerramento das atividades do colegiado, mesmo sem ter localizado e identificado todas as vítimas, que são estimadas em 434 pessoas.

A medida causou forte repercussão e a reunião acabou sendo adiada diante da pressão de entidades ligadas à defesa dos direitos humanos e familiares de mortes e desaparecidos.

Num período anterior, em audiência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, ex-conselheiros da Comissão de Anistia e pesquisadores denunciaram diversas irregularidades no órgão sob o governo de Bolsonaro.

O presidente da Comissão, João Henrique de Freitas, não compareceu. Mas, segundo dados do site da Comissão de Anistia, foram recebidos 79.183 requerimentos, dos quais 75 mil foram arquivados. Há 3.887 pedidos aguardando análise e 263 em finalização. O órgão conta com um conselho consultivo, no entanto a decisão final cabe ao ministro.

Levantamento feito pelo site Metrópoles, em junho do ano passado, com base em dados do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, ao qual à Comissão passou a ser vinculada no governo de Bolsonaro, revelou que, desde 2019, cerca de 90% dos pedidos de anistia pelas vítimas da ditadura militar foram indeferidos. Em 2020, mais 2.721 processos não conseguiram aprovação, ou 91,3% do total analisado.

De presídio à parque

De acordo com o projeto inicial, o Carandiru era um presídio que comportaria 1.200 pessoas. Na década de 1950, o espaço foi ampliado para receber 3.250 detentos. Mesmo assim, a casa de detenção foi marcada pela superlotação, maus tratos e má administração.

Dez anos depois do perverso massacre noticiado na mídia de todo o mundo, foi necessário transformar aquela cena de violência que ficou marcada no imaginário de São Paulo. Assim, foi dado início um projeto para desativar o complexo penitenciário do Carandiru e ressignificar o espaço em algo que pudesse prestar serviço social à comunidade.

No local, foi inaugurado o Parque da Juventude "Dom Paulo Evaristo Arns" em setembro de 2003 e teve concluída sua terceira etapa em 2007. O espaço é dividido nas áreas Institucional (Escolas técnicas-Etecs e biblioteca), Central (bosques, gramados, ruínas) e Esportiva (quadras poliesportivas, pistas de Skates e outros espaços), segundo o site da instituição.

CSP-Conlutas com informações: Agência Câmara de Notícias e Parque da Juventude