A Câmara dos Deputados aprovou nessa quarta-feira (10) o projeto de autonomia do Banco Central (PLP 19/2019), que altera a composição da diretoria do Banco Central e define que os mandatos do presidente e dos diretores do BC não terão vigência coincidente com o do presidente da República. A proposta, aprovada por 339 votos a 114, teve origem no Senado e será enviada à sanção presidencial.
Com a aprovação do PLP 19/2019 com votação expressiva, mais que a necessária para aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que são 308 votos, a Câmara mostrou seu apoio ao governo Bolsonaro, que usou R$ 3 bi em emendas, além de cargos, para garantir a eleição de seu indicado à presidência da Casa. O projeto da autonomia do BC consta da lista de 35 propostas que o governo classificou como prioritárias, em lista apresentada no dia de retomada dos trabalhos do Congresso Nacional.
Cheque em branco para os bancos
O projeto caracteriza o Banco Central como uma autarquia de natureza especial sem vínculo, tutela ou subordinação hierárquica a qualquer ministério, garantindo a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira. Ou seja, o órgão responsável pela política monetária e fiscal do país não responderá a nenhuma instância superior.
Adicionalmente, o BC ficará à margem de todos os sistemas de controle, contabilidade pública, entre outros, e utilizará “sistemas informatizados próprios, compatíveis com sua natureza especial”.
De acordo com o projeto aprovado, o presidente e diretores do BC só poderão ser demitidos se quiserem ou adoecerem. Caso sejam acusados de fraudes, só poderão ser demitidos depois de condenados, ou seja, depois de todo o trâmite judicial até a condenação e estabelecimento de pena.
“E, no caso de [comprovado e recorrente] desempenho insuficiente, a iniciativa terá que ser do Conselho Monetário Nacional (CMN), ou seja, do próprio BC. E [a demissão] ainda dependerá de maioria absoluta no Senado! Tudo sob controle da banca!”, afirma Maria Lucia Fattorelli, em artigo da Auditoria Cidadã da Dívida (ACD).
O CMN é composto apenas pelo presidente do BC e pelo ministro da Economia e um subordinado seu. “Na prática, é o próprio presidente do BC que leva ao CMN todas as propostas relacionadas à política monetária do país”, alerta a auditora fiscal aposentada.
Os mandatos serão de quatro anos e haverá um escalonamento para que apenas no terceiro ano de um mandato presidencial a maioria da diretoria e o presidente do BC tenham sido indicados pelo mandatário do Poder Executivo. A indicação continuará a depender de sabatina do Senado. Cada indicado poderá ser reconduzido para mais um mandato sem passar por nova sabatina.
Fattorelli lembra que os indicados para a diretoria do BC serão pessoas “de confiança do mercado”. “O Banco Central passa a ser controlado, de vez, por aqueles que a instituição deveria fiscalizar, e a política monetária suicida ficará ainda mais blindada pelos interesses do mercado financeiro”, acrescenta.
A coordenadora da ACD denuncia ainda que, ao passar o controle da moeda e a política monetária do país para as mãos dos bancos, a lei aprovada na Câmara atenta também contra os objetivos fundamentais da República, contra a democracia e contra a nossa soberania.
“E, apesar de toda essa “autonomia”, o Banco Central não se responsabiliza por seus prejuízos que, segundo Art. 7º da Lei de Responsabilidade Fiscal, são transferidos e arcados pelo Tesouro Nacional, ou seja, por todos nós!”, ressalta.
Marco Legal do Mercado de Câmbio
Ainda sinalizando apoio às pautas ultraliberais do governo Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, a Câmara aprovou também, na noite dessa quarta, o projeto de lei 5387/19. A proposta define o Marco Legal do Mercado de Câmbio, abrindo espaço para a dolarização da economia brasileira. O PL 5387/19 também está entre as prioridades apresentadas pelo governo para o Congresso Nacional.
A proposta permite, entre outras movimentações, que bancos e instituições financeiras brasileiras investirem no exterior recursos captados no País ou no exterior, além de facilitar o uso da moeda brasileira em transações internacionais.
De acordo com o substitutivo aprovado, do deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA), as instituições financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central poderão usar esse dinheiro para alocar, investir, financiar ou emprestar no território nacional ou no estrangeiro.
O PL 5387/19 aumenta ainda os casos em que será permitido o pagamento em moeda estrangeira de obrigações devidas no território nacional. Outra alteração proposta no texto é a permissão para que empresas que remetem dinheiro ao exterior a título de lucros, dividendos, juros, pagamento por royalties e outras finalidades regulamentadas o façam sem a necessidade de registro perante o Banco Central, como ocorre atualmente. A única exigência passa a ser o pagamento do imposto.
O texto segue para apreciação e votação no Senado.
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ANDES-SN com informações e imagem da Agência Câmara de Notícias e da Auditoria Cidadã da Dívida