Congresso promulga PEC dos Precatórios e oficializa calote de R$ 46 bi, que afeta milhares de aposentados
Artur Lira, presidente da Câmara, e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, em sessão do Congresso. Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

O Congresso Nacional promulgou, nesta quinta-feira (16), a Emenda Constitucional 114 com os trechos remanescentes da chamada “PEC dos Precatórios” (PEC 23). O texto estabelece a partir do próximo ano um limite no pagamento dos precatórios da União, que são as dívidas do governo fruto de decisões judiciais definitivas. Em outras palavras, a medida impõe um calote que vai afetar milhares de brasileiros que ganharam ações na Justiça e agora verão seus direitos entrarem numa fila para pagamento.

Na semana passada, após acordo entre o Senado e a Câmara para fatiar a votação da PEC 23, o Congresso já havia promulgado a EC 113, que ampliou o Teto de Gastos e abriu uma folga de R$ 65 bilhões para o governo. Leia: PEC dos Precatórios é promulgada parcialmente e votação de “calote” fica para terça-feira (14)

Segundo o Ministério da Economia, em 2022, a dívida do governo com precatórios soma R$ 89 bilhões. A EC 114 reduz o valor a ser pago para cerca de R$ 43 bilhões no ano que vem. Os recursos não pagos deverão ser empregados, em 2022, exclusivamente em seguridade social e no programa Auxílio Brasil.

Desse montante, só serão descontadas as requisições de pequeno valor (até 60 salários mínimos), que não entram no teto. Os precatórios que não forem pagos em razão do limite terão prioridade de pagamento nos anos seguintes, observada a ordem cronológica e novas regras constantes da EC 114.

O credor não contemplado no orçamento poderá optar pelo recebimento em parcela única até o fim do ano seguinte se aceitar desconto de 40% por meio de acordo em juízos de conciliação.

O calote nos precatórios seguirá sendo feito até 2026. Inicialmente, o governo propôs até 2036. Segundo estimativa da Auditoria Fiscal Independente do Senado, ao final, o calote pode chegar a mais de R$ 850 bilhões.

Aposentados sem receber direitos

Aposentados serão um dos principais prejudicados com essa emenda, mas professores, entes da federação (estados e municípios) e empresas também serão afetados.

Um levantamento do Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos), com base nos dados públicos de tribunais federais, mostra que um terço (34%) dos precatórios de 2022 é de natureza “alimentar”, ou seja, são dívidas de aposentadorias, pensões, indenizações e salários atrasados históricos do INSS.

São aproximadamente 200 mil pessoas que representam cerca de R$ 31 bilhões da composição dos precatórios do próximo ano. Trabalhadores aposentados que lutaram anos por um direito e agora serão prejudicados.

Fundef

Professores também terão seus direitos afetados pela medida e o pagamento dos precatórios referentes ao antigo Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) será parcelado.

Pelo texto, esse tipo de precatório será pago em três parcelas anuais a partir de sua expedição: 40% no primeiro ano, 30% no segundo ano e 30% no terceiro ano. O texto aprovado no Senado definia o pagamento nos meses de abril, agosto e dezembro. Mas, na Câmara, as datas foram retiradas do texto e o governo poderá pagar ao longo do ano como preferir.

Após muita pressão, ficou definido que esses precatórios ficarão de fora dos limites do teto de gastos e de pagamento anual de precatórios. Do total, 60% deverão ser repassados aos profissionais do magistério, inclusive aposentados e pensionistas, na forma de abono, proibida a incorporação na remuneração, aposentadoria ou pensão.

Segundo a Consultoria de Orçamento da Câmara, do total de precatórios previstos para pagamento em 2022, 26% (R$ 16,2 bilhões) se referem a causas ganhas por quatro estados (Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas) contra a União, em razão de erros nos cálculos dos repasses do antigo Fundef.

Renda básica

A partir da emenda promulgada, a Constituição passa a reconhecer o direito de todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social a uma renda básica familiar garantida por programa público permanente.

Entretanto, os limites, condições, normas de acesso e demais requisitos do programa serão determinados por lei e regulamento até 31 de dezembro de 2022. Ou seja, apesar do calote nos precatórios valer até 2026, não está definido como será feito o pagamento dessa renda básica.

Exclusivamente para o próximo ano, será dispensada a observância das limitações legais quanto à criação de despesa permanente. A Lei de Responsabilidade Fiscal exige a criação de receita permanente ou a redução permanente de despesa continuada para a criação de despesa obrigatória desse tipo.

Recursos em ano eleitoral

As duas emendas promulgadas pelo Congresso, a EC 113 (que ampliou o Teto de Gastos) e a EC 114 (calote nos precatórios), abrem um espaço fiscal para Bolsonaro da ordem de mais de R$ 110 bilhões no Orçamento de 2022, um ano eleitoral. O governo conseguiu assim um de seus principais objetivos que era garantir o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400 num ano de eleições.

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O Auxílio Brasil é uma necessidade para milhões de brasileiros que estão sofrendo com o desemprego, a carestia e a fome. Mas o valor de R$ 400 foi definido apenas para o próximo ano em que haverá eleições. Mas ficou para depois a regulamentação do valor a ser pago nos anos seguintes.

Para bancar o auxílio, bem como garantir serviços públicos gratuitos e de qualidade e outras reivindicações dos trabalhadores, não era necessário um calote bilionário, que irá prejudicar aposentados e professores.

O governo tem recursos em caixa no Tesouro. Sem falar que basta parar de desviar o dinheiro público para banqueiros através do pagamento de juros da Dívida Pública ou ainda para os esquemas de toma-lá-da-cá no Congresso, como as chamadas “emendas de relator”.

A CSP-Conlutas defende que para garantir de fato investimentos públicos e direitos sociais é preciso medidas tais como a revogação da Emenda Constitucional 95 que estabeleceu o Teto de Gastos, mecanismo que estrangula o orçamento do país e impede os investimentos necessários para garantir direitos básicos para a população. É preciso ainda a suspensão imediata do pagamento da fraudulenta Dívida Pública.

CSP-Conlutas com informações Agência Câmara