O relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2021, publicação anual do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) foi divulgado ontem (17) e traz um retrato devastador fruto da política anti-indígena adotada por Bolsonaro e por seu governo de ultradireita nos últimos quatro anos. Os dados demonstram o aumento das invasões de territórios e da morte de indígenas.
Em 2021, o Cimi registrou a ocorrência de 305 casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio”, que atingiram pelo menos 226 Tis (Terras Indígenas), em 22 estados do país. No ano anterior, 263 casos de invasão haviam afetado 201 terras em 19 estados. Com isso, a quantidade de casos no ano passado é quase três vezes maior do que a registrada em 2018, quando foram contabilizados 109 casos do tipo.
O relatório registrou aumento em 15 das 19 categorias de violência sistematizadas pela publicação em relação ao ano anterior, e uma quantidade enorme de vidas indígenas interrompidas.
No total, foram 355 casos entre as 19 categorias de violência, como morte, ameaças, estupros, lesões, racismo e tentativas de assassinato, o maior índice desde 2013.
Foram registrados 176 assassinatos de indígenas – apenas seis a menos do que em 2020, que registrou o maior número de homicídios desde que o Cimi passou a contabilizar este dado com base em fontes públicas, em 2014. O número de suicídios de indígenas em 2021, 148, foi o maior já registrado neste mesmo período.
Entre os povos mais afetados estão os yanomamis (em Roraima e no Amazonas), os mundurukus (Pará), os pataxós (Bahia), muras, (Amazonas), uru-eu-wau-waus e karipunas (Rondônia), chiquitanos (Mato Grosso) e kadiwéus (Mato Grosso do Sul).
Etnocídio e devastação ambiental a favor de criminosos
Antes mesmo de ser eleito, Bolsonaro defendeu a paralisação completa de qualquer demarcação de territórios indígenas, ao mesmo tempo em que usou um discurso que incentiva a ação ilegal de garimpeiros, mineradoras, madeireiras, caçadores, pescadores, grileiros e do agronegócios sobre territórios indígenas, pano de fundo das violências bárbaras impostas aos povos originários no Brasil.
O relatório do Cimi aponta que além do aumento quantitativo de casos e terras afetadas pela ação ilegal de garimpeiros, madeireiros, caçadores, pescadores e grileiros, entre outros, os invasores intensificaram sua presença e a truculência de suas ações nos territórios indígenas. Essa situação ficou explícita em casos como o dos povos Munduruku, no Pará, e Yanomami, em Roraima e Amazonas.
Na Terra Indígena (TI) Yanomami, onde é estimada a presença de mais de 20 mil garimpeiros, os invasores passaram a realizar ataques armados sistemáticos contra as comunidades indígenas, espalhando um clima de terror e provocando mortes, inclusive de crianças.
Os ataques criminosos, com armamento pesado, foram denunciados de forma recorrente pelos indígenas – e ignorados pelo governo federal, que seguiu estimulando a mineração nestes territórios, inclusive com a apresentação de projetos no Congresso Nacional. Medidas como a Instrução Normativa número 9, publicada pela Funai em 2020, que permitiu a certificação de propriedades privadas sobre terras indígenas não homologadas, e a instrução conjunta com o Ibama que permitiu a exploração econômica de terras indígenas por associações e organizações compostas por indígenas e não indígenas, ou ainda a defesa da tese do Marco Temporal.
O Cimi ressalta ainda que os garimpos serviram como vetor de doenças como a Covid-19 e a malária para os Yanomami.
No Pará, garimpeiros que atuam ilegalmente na TI Munduruku atacaram a sede de uma associação de mulheres indígenas, tentaram impedir o deslocamento de lideranças do povo para manifestações em Brasília, fizeram ameaças de morte e chegaram a queimar a casa de uma liderança, em represália a seu posicionamento contra a mineração no território. Enquanto essas ações ocorriam, a TI Munduruku seguiu sendo devastada, com rios e igarapés destruídos pelo maquinário pesado utilizado na extração ilegal de ouro.
“Os dados registrados pelo presente relatório indicam que as diversas omissões do governo federal, e os muitos conflitos e situações de vulnerabilidade que delas decorrem, tiveram reflexos graves para toda a população indígena do país. O ano de 2021 foi marcado pela grande quantidade de vidas indígenas perdidas”, analisam Lucia Helena Rangel e Roberto Antonio Liebgott, organizadores do Relatório, na introdução da publicação.
“As invasões possessórias assumiram, neste ano, contornos dramáticos pela intensidade, continuidade, quantidade e pela imposição da força e da violência contra as comunidades dentro de seus próprios territórios”, apontam.
Confira aqui a íntegra do relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2021
CSP-Conlutas com informações: Cimi