O segundo dia do XIX Encontro do Setor das Estaduais e Municipais (Iees/Imes) do ANDES-SN teve início na manhã do sábado (21) com a apresentação do resultado da pesquisa sobre o financiamento das Iees/Imes, conforme deliberação do 41º Congresso do ANDES-SN, que encaminhou a atualização e a divulgação dos dados parciais da pesquisa. O evento ocorre na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual do Maranhão (Uema), na capital São Luís, mais conhecida como Ilha do Amor.
O estudo trouxe dados sobre os gastos com pessoal e encargos sociais (efetivos, substitutos e, em alguns casos, aposentados), despesas correntes (gastos cotidianos para a manutenção das atividades acadêmicas) e investimentos (obras, reformas e aquisição de equipamentos) nas universidades estaduais e municipais brasileiras.
De acordo com os docentes Luiz Henrique Blume, da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), e Edmilson Aparecido da Silva, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), que fizeram parte da construção do banco de dados, houve uma tendência nos últimos anos ao desfinanciamento nas universidades por parte dos governos. A pesquisa mapeou, nesta etapa, o repasse orçamentário a 37 instituições entre 2007 e 2022.
Segundo eles, o crescimento das despesas totais ocorreu até o ano de 2013. A partir de 2014, o decréscimo foi considerável, demarcando uma redução de 11,1% das despesas totais nas instituições pesquisadas. No total das despesas com pessoal, por exemplo, a amostra da pesquisa passou por uma estagnação a partir de 2013. As outras despesas correntes também foram atingidas e sofreram uma redução sistemática de 2013 para 2018. A queda foi de R$ 6 bilhões para R$ 5,4 bilhões, acumulando perdas de 10%.
Os docentes afirmaram que os dados apresentados têm como finalidade de instrumentalizar a categoria docente para enfrentar a realidade de cortes no financiamento das instituições públicas e, dessa forma, possibilitar melhores condições para travar as disputas pelo fundo público nas mesas de negociações com os governos.
Segundo Flávia Spinelli Braga, da coordenação do Setor das Iees/Imes do ANDES-SN, a ideia é ampliar a amostragem. A docente convidou as novas seções sindicais a participarem da alimentação da base de dados sobre suas universidades e afirmou que a ideia é atualizar o sistema para apresentar no próximo Congresso do ANDES-SN, que ocorrerá no final de fevereiro do próximo ano em Fortaleza (CE).
“Firmamos a contratação dos bolsistas estatísticos apresentando um novo elemento que é a ótica das receitas públicas dos estados, analisando o que entra e o que é executado em cada estado, em parceria com as nossas Secretarias Regionais e seções sindicais, no intuito de conciliar o nosso discurso de formação política voltada para a discussão de carreira também com o GT Verbas, que trabalha e fortifica todo o conhecimento relacionado à nossa posição política frente aos governos e as despesas e investimentos feitos de 2007 até os últimos dias do ano de 2023. As demandas das Estaduais serão levadas como proposta para o Congresso na atualização do Plano de Lutas do Setor das Estaduais e Municipais”, contou a mediadora da mesa.
O debate seguinte tratou do Arcabouço fiscal, das dívidas dos estados, da renúncia fiscal e do financiamento das Iees/Imes. Rodrigo Ávila, da Auditoria Cidadã da Dívida, afirmou que o sistema da dívida pública é ilegítimo. Em 2022, os gastos do governo federal com o pagamento de juros e amortizações da dívida somaram R$ 1,8 trilhão, o que representou 46,3% do Orçamento Federal Executado (pago), consumindo, portanto, a maior fatia de todos os recursos públicos federais. O economista afirma que após o pagamento da dívida, sobra menos de um quarto (11%) para as transferências constitucionais aos estados e municípios, o que impacta diretamente o orçamento das universidades.
Raquel Dias, presidenta em exercício do ANDES-SN, trouxe um histórico de como, em decorrência do pagamento dos juros e amortizações da dívida pública, as políticas de renúncia fiscal foram implantadas no país nas últimas décadas e como elas prejudicam o conjunto da classe trabalhadora e populações marginalizadas, com o aumento da desigualdade social, do desemprego, da redução de direitos e do aumento do trabalho precarizado. Ela citou como os ataques se intensificam por meio de projetos como: a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32 de 2020, a Contrarreforma Administrativa herdada do governo Bolsonaro (PL); o Arcabouço Fiscal, que limita os investimentos com gastos sociais e, mais uma vez, prioriza os gastos com o sistema da dívida pública; além dos planos de recuperação fiscal nos estados que seguem na mesma linha.
"É fundamental o ANDES-SN, no XIX Encontro do Setor das Iees/Imes, trazer o debate sobre ‘Arcabouço fiscal, dívidas dos estados, renúncia fiscal e financiamento das Iees/Imes’. Precisamos contrapor o discurso hegemônico fiscalista, porque 46,3% do orçamento é gasto com o pagamento da dívida pública, juros e amortizações. Essa crise é fabricada e nos estados é ainda pior com o Regime de Recuperação Fiscal", avaliou a docente Rena Gama, da coordenação do Setor das Iees/Imes, que conduziu o debate.
A mesa “Autonomia, Financiamento e Direitos” contou com a participação de docentes de diversas universidades estaduais do país que relataram os problemas enfrentados em suas universidades. Gilberto Calil, 1º vice-presidente da Regional Sul e da coordenação do Setor das Iees/Imes do ANDES-SN, apresentou a realidade vivida pela comunidade acadêmica das universidades estaduais públicas paranaenses que levaram um duro golpe com a aprovação da Lei Geral das Universidades (LGU) em 2021. A lei é um ataque à autonomia universitária e precariza as condições de trabalho, com a redução no número de docentes efetivos, limitação da Dedicação Exclusiva, ameaça de fechamento de cursos caso o total de estudantes matriculados for menor que 50% do total de vagas, além de estimular a terceirização.
Michele Schultz, 1º vice-presidenta da Regional São Paulo e coordenadora do Fórum das Seis – que reúne seções sindicais do ANDES-SN, sindicatos de técnicas e técnicos e representações estudantis das três universidades estaduais de São Paulo – apresentou um breve histórico sobre os ataques à autonomia universitária e didático-científica. Ela pontuou que os ataques mais graves estão relacionados com a privatização das universidades – precedida pela retirada de recursos – e pelo desmonte de setores importantes das instituições. Schultz também mostrou preocupação com o impacto da proposta de Reforma Tributária no financiamento das universidades paulistas. O financiamento hoje está atrelado ao ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços) e será substituído por um novo imposto sobre bens e serviços, caso o projeto seja aprovado.
Já Elson Moura, coordenador do Fórum das ADs Bahia, que agrega as seções sindicais do ANDES-SN nas quatro Universidades Estaduais da Bahia (Ueba), destacou a pauta histórica sobre financiamento e orçamento construída coletivamente por docentes e técnicos, que reivindicam a destinação de, no mínimo, 7% da Receita Líquida de Impostos (RLI) do estado da Bahia para o orçamento anual das universidades estaduais, com revisão do percentual a cada dois anos. Desde 2015, há um quadro decrescente de repasses, que chegou drasticamente em 2021 a apenas 3,28% da RLI, mesmo com o governo alegando que repassa 5%.
Renata Gama, 2º vice-presidenta da Regional Rio de Janeiro, e da coordenação do Setor das Iees/Imes, defendeu a autonomia universitária devido a sua importância para se contrapor aos poderes políticos e econômicos e a lógica produtivista. No Rio de Janeiro, as e os docentes enfrentam a defasagem salarial, a desigualdade na carreira e a precarização dos contratos de docentes do Ensino a Distância (EAD).
José Helber, presidente da Associação dos Docentes da Universidade Estadual da Paraíba (ADUEPB- Seção Sindical do ANDES-SN), também contou que no seu estado, as e os docentes sofrem com os cortes orçamentários e lutam por autonomia universitária, financiamento e direitos.
Para Gisvaldo Oliveira, da coordenação do Setor das Iees/Imes, o debate realizado com as e os docentes foi fundamental por tratar de temas fundamentais para a construção da pauta do Sindicato Nacional. “A luta pela autonomia didático-pedagógica e de gestão financeira das instituições estaduais e municipais de ensino superior é um princípio fundamental para que as nossas universidades possam cumprir sua função social de realizar ensino, pesquisa e extensão. Nesse sentido, aprofundar o debate sobre a construção da luta conjunta do Setor das Iees/Imes para assegurar esse princípio segue sendo imprescindível. Não podemos permitir que nossas universidades se tornem reféns da dominação de grupos políticos e econômicos que almejam mercantilizar a educação”, defendeu.
A última mesa de debates do XIX Encontro tratou das condições de trabalho e saúde docente e, também, do combate ao assédio moral e sexual nas Iees/Imes. Amanda Moreira, presidenta da Associação dos Docentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Asduerj SSind.) abriu a mesa com a apresentação dos resultados da primeira etapa da enquete sobre saúde e condições de trabalho das trabalhadoras e trabalhadores das Federais, Estaduais e Municipais do ANDES-SN. O questionário foi aplicado, na primeira fase, em 11 instituições de ensino e revelou que em relação à saúde docente, 52% consideram que no último ano a saúde piorou; no campo das relações de trabalho, 43% consideram que as relações interpessoais com colegas pioraram após o retorno presencial, 66% disseram já ter sofrido assédio moral e 15% assédio sexual. Das e dos que responderam a enquete, 64% são sindicalizados. A pesquisadora ressalta a importância de expandir a enquete para as demais universidades, institutos federais e Cefet.
Caroline Lima, 1ª secretária do ANDES-SN, contou um pouco sobre o combate ao assédio moral e sexual nas Iees e Imes realizado pelo Sindicato Nacional. Ela apontou que a criminalização do assédio sexual no país é recente, efetivada em 2001, com a aprovação da Lei nº 10.224. Para a docente, para debater assédio sexual e moral no ambiente de trabalho é necessário refletir sobre as relações de poder e a cultura de estupro, principalmente, no Brasil. Esses tipos de violências afetam especialmente as mulheres e se caracterizam como um meio de exercer controle e poder sobre elas nas relações laborais. Ela reforçou o papel do sindicato que é o de formar e informar, fomentar espaços de debates e de acolhimento, cobrar apuração dos crimes e combatê-los.
“As pessoas estão fragilizadas, adoecidas tanto o lado oprimido quanto o que oprime que também está doente pela pressão do trabalho, da lógica neoliberal meritocrática que exige cada vez mais das nossas e dos nossos colegas. Então, falar dessa mesa nesse encontro é transversal a todos os temas que debatemos nesse segundo dia. Esse tema não é ‘mimimi’ ou não teria tido aqui 16 inscrições. Fica a reflexão de que só a luta muda a vida e ainda temos uma luta muito grande a travar que passa por derrotar esse sistema que nos oprime e, ao mesmo tempo, educar e orientar a nossa categoria em como enfrentar o adoecimento mental, os assédios e as violências que vivemos dentro das nossas universidades”, finalizou Annie Schmaltz, 3ª secretária do ANDES-SN e da coordenação do Setor das Iees/Imes, que mediou o debate.
O XIX Encontro do Setor das Estaduais e Municipais termina neste domingo (22), com a realização da Plenária final em que serão discutidas as resoluções do 41º Congresso do ANDES-SN e do 66º Conad e proposição de novos encaminhamentos para o 42º Congresso do Sindicato Nacional.
Música
Após a finalização dos debates, o cantor, compositor e instrumentista Ronald Pinheiro embalou as e os docentes com os seus sucessos. O artista maranhense já foi gravado por grandes cantoras brasileiras, entre elas, Alcione.
Via andes.org.br