Crescimento expressivo da EAD precariza trabalho docente

 

Cursos de graduação presenciais poderão ofertar até 40% das aulas à distância. O limite anterior era de 20%. A medida foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) pelo Ministério da Educação (MEC), no último dia de 2018. Segundo a portaria nº 1428, os estudantes devem ser informados pelas Instituições de Ensino Superior (IES) que parte do curso será em formato de Educação à Distância (EAD). As instituições devem detalhar, de maneira objetiva, as disciplinas, conteúdos, metodologias e formas de avaliação dessas aulas.

Elizabeth Barbosa, 2º vice-presidente da Regional Rio de Janeiro e uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Política Educacional (GTPE) do ANDES-SN, afirma que a ampliação da oferta impactará diretamente os docentes e a qualidade do  ensino. “A decisão do MEC piora o ensino presencial. Aquele professor que está na sala de aula terá que assumir disciplinas à distância, precarizando ainda mais o seu trabalho e a qualidade do ensino. É assustador. Estamos vivendo um momento muito duro na universidade”, lamentou. Ela destaca que a categoria docente já enfrenta diversos problemas resultantes da Emenda Constitucional 95/16, que estipula um teto de gastos para os serviços públicos. “A falta de concursos públicos, a Reforma da Previdência, um número alto de aposentadorias e de pedidos que estão em processo e um baixo número de professores”, elenca.

EAD nos cursos de mestrado e doutorado

Ainda no final do ano passado, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) divulgou um documento para subsidiar a portaria que regulamenta o funcionamento de cursos de mestrado e doutorado na modalidade EAD. O trabalho foi coordenado por diretorias da própria fundação, que é vinculada ao MEC. Representações de docentes, técnicos, estudantes e de comunidades científicas não participaram da decisão. Para Elizabeth Barbosa, além da precarização do trabalho docente, a inclusão da modalidade na pós-graduação strictu sensu significará maior destinação do fundo público para a iniciativa privada. Maior destinação porque, ao longo dos anos, a modalidade EAD vem crescendo e se espraiando dentro das IES. “Entre 2004 e 2010, a inserção da EAD se dava nas universidades privadas, com várias disciplinas ofertadas na área da saúde. A partir de 2009 inicia um movimento na graduação da universidade pública e, recentemente, na pós-graduação”, explica. Essa expansão contou com relativo apoio das instituições de ensino. A Universidade Federal Fluminense (UFF), onde Elizabeth leciona, por exemplo, abriu um edital que premiava professores que criassem disciplinas à distância no ensino presencial. 

Crescimento da EAD

A Educação à Distância nas IES privadas e públicas tem crescido vertiginosamente no país nos últimos anos. Até 2007, o número de matrículas referentes à EAD privada e pública era semelhante. Em 2006, a diferença de matrículas era inferior a 15 mil (33,7 mil privada e 19,2 públicas). Três anos depois, a diferença quase alcançou meio milhão (665, 4 mil privada e 172, 6 mil pública). Em 2017, a diferença chegou a 1,4 milhão. (1,5 milhão privado e no 165,5 mil público).

Olinda Evangelista, docente da Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc) explica que a EAD começou a se consolidar a partir dos anos 2000. A professora, que estuda o tema formação docente, explicou que entre 2006 e 2007 as matrículas de EAD cresceram em decorrência do fenômeno da apropriação da formação docente no Brasil por grandes empresas financeirizadas. “Do ponto de vista do modelo do capital, esse movimento é no sentido de se apropriar da formação docente, ofertando cursos mais baratos. De certa maneira, são os cursos que possuem uma demanda constante. É a consolidação de um nicho de mercado, que inclui a venda de certificação em massa, de materiais didáticos, de novas tecnologias e de concessão de bolsas de estudos pelas próprias instituições privadas, que refinanciam o valor quando os alunos não podem pagar, gerando um fenômeno de endividamento juvenil no país”, explica.

Licenciatura e Formação docente

Das 1,7 milhão de matrículas realizadas em 2017 na modalidade EAD, 743,4 mil foram em cursos de licenciatura. Segundo o Censo da Educação Superior, entre 2010 e 2015, o curso com o maior número de matrículas EAD no Brasil era o de Pedagogia, seguido por Administração e por Serviço Social. “A apropriação da formação docente é uma estratégia de acumulação de lucros, assim como é estratégica a apropriação da formação da classe trabalhadora. Uma formação precarizada do professor é fundamental para a formação de uma classe trabalhadora alienada”, argumentou Olinda Evangelista. Para Evangelista, o Estado tem o papel importante de formação do magistério. Contudo, “progressivamente o Estado abre mão da formação docente em favor da esfera privada. Não que o Estado não seja burguês, mas mesmo no Estado burguês clássico, a formação sempre foi uma tarefa dele”, apontou.

Respaldo Legal

No Brasil, a modalidade de educação à distância obteve respaldo legal para sua realização com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996. A legislação estabelece a possibilidade de uso orgânico da modalidade de educação à distância em todos os níveis e modalidades de ensino. Em 2007, o MEC publicou um documento que direcionava a Educação à Distância. Como parte da reforma do Ensino Médio, o Conselho Nacional de Educação aprovou em novembro do ano passado a liberação de 20% da carga horária do ensino médio para EAD. 

 

Fonte: InformANDES/2019